A simplicidade fascina-me.
Sou desprovida da capacidade de ser simples e por isso sou infeliz. Penso demais nas coisas.
Porque todo aquele que pensa, examina. Todo aquele que examina disseca os mistérios da vida roubando-lhe lentamente a magia e a vontade de existir. É esta, em suma, a causa da depressão. O conhecimento da triste realidade. O reconhecimento de que não há mesmo mais nada, que o que se vê é aquilo que temos. E isso é insuportável. Tão insuportavel que procuramos refúgio nas coisas mais absurdas, nas rotinas mais castradoras, nos vícios mais destutivos. Afogamos as mágoas em visitas ao supermercado e baldes de gelado de litro e meio, enquanto nos viramos para o ecrã e lhe imploramos que nos entretenha. Lemos a Maria, a TV Guia, a Mariana e a Caras para nos lembrarmos que não é por sermos bonitos e famosos que temos menos problemas. Rimo-nos da desgraça alheia com desdém e escondemos as vergonhas próprias junto ao pó da casa, por baixo do tapete de arraiolos da gigantesca sala de estar. Falamos do amigo da tia da filha da vizinha que diz que fez não sei o quê á sobrinha do marido da Maria Amália e que ela agora está muito mal, coitadinha.
É esta vergonhosa a essência do ser humano: renegamos a tão invejada inteligência sem nos apercebermos disso. Apagamos a consciencia com entretenimento barato, musicas descartáveis e relações amorosas superficiais, enquanto nos obrigamos a acreditar piamente que temos uma missão no mundo, que somos imprescindíveis à humanidade. E isso faz-nos humanos burros.
Burros, mas felizes.